5 Lições de uma auxiliar geriátrica experiente em lar de idosos
Por Joana Marques , 19 de Outubro de 2020 Profissionais
As auxiliares de geriatria (ou cuidadoras formais) são indispensáveis na prestação de cuidados e podem fazer a diferença no que se refere à qualidade de vida e dignidade do idoso. Idealmente, fazem companhia e prestam cuidados, ao mesmo tempo que incentivam os idosos a fazer o seu melhor, independentemente do grau de dependência.
As auxiliares de geriatria são fundamentais para o bem-estar dos idosos institucionalizados.
É necessário melhorar as condições de trabalho, para que as auxiliares se vinculem às instituições e criem relações mais humanas e profundas com os idosos que estão ao seu cuidado. Quanto maior for o seu vínculo ao lar, melhor será a qualidade de vida dos idosos, que preferem sempre uma cara conhecida e amiga.
O saber técnico permite ao profissional zelar pelo bem-estar físico, psicológico e social do idoso, mas não é suficiente para que os cuidados prestados sejam humanizados e afetivos.
Neste artigo vamos explorar cinco lições importantes para o trabalho das cuidadoras nos lares, que contribuem para uma imagem mais positiva do que aquela que por vezes ainda subsiste na nossa sociedade.
1 - Tratar é diferente de cuidar
O dia-a-dia da auxiliar de geriatria é tratar da higiene pessoal e alimentação, controlar a toma de medicamentos e ajudar no vestir, na mobilidade física e na comunicação.
O ato de tratar assenta no saber técnico e na execução mecânica das tarefas, sem que tenha de existir empatia ou preocupação.
Já o ato de cuidar implica uma abertura emocional por parte do cuidador e é caracterizado pela atenção dada ao idoso. Pressupõe cautela, dedicação e carinho pelo idoso e respeito pela profissão. Uma auxiliar de geriatria deve gostar da pessoa idosa, pois essa ligação emocional é propícia à prestação de cuidados dignos e humanizados.
Cuidar mobiliza diversas vertentes do ser humano: relacional, afetiva, ética, sociocultural, terapêutica e técnica.
Trabalhar num lar ensina que quanto mais humanas forem as acções, melhor é a qualidade de vida, tanto do idoso como da auxiliar. É claro que existem bons e maus profissionais, mas estes últimos nunca vão aprender a mais-valia que é sentir compaixão e vontade de aliviar a aflição do outro.
A idade traz sofrimento físico e psicológico, mas é possível diminuir esse mal-estar se a auxiliar for atenciosa e compassiva.
Quem se limita a tratar de um idoso não pretende mais do que satisfazer as suas necessidades básicas, o que impõe distanciamento entre o idoso e o cuidador.
É preciso tempo e disponibilidade para que se estabeleçam laços emocionais, pelo que é fundamental que o auxiliar não esteja sobrecarregado.
Ser compassivo e empático deviam ser dados adquiridos quando alguém decide trabalhar com idosos. Pode acontecer que a auxiliar vá adquirindo estas qualidades ao longo do tempo, mas apenas se tiver um ambiente de trabalho propício à atenção individualizada.
2 - A paciência é uma grande virtude
O cuidador aprende com alguma rapidez que a paciência é uma espécie de super-poder, especialmente se está a lidar com idosos difíceis e cujo temperamento representa um desafio extra na prestação de cuidados.
Um auxiliar depressa aprende tudo se torna mais fácil se se mantiver imperturbável. Manter a compostura ajuda a evitar o conflito.
Todos temos dias melhores e outros piores e somos suscetíveis de descarregar as nossas frustrações em cima de quem nos é mais próximo, e isto também é válido no relacionamento entre idosos e cuidadores. Nem sempre é fácil manter uma atitude imperturbável quando o idoso é teimoso e se recusa a cooperar, ou se está mentalmente instável / com sinais de demência.
Ao longo do tempo, a auxiliar vai-se tornando cada vez mais paciente e resiliente, pois esta é a única forma de evitar conflitos ou atos de agressividade.
Envelhecer é um processo natural, mas para alguns é difícil, desanimador e frustrante. Os cinco sentidos vão falhando, a mobilidade vai-se deteriorando, a lucidez e a memória já não são o que eram e as dores são cada vez mais frequentes. Assim, o lema do cuidador deve ser: «cuide do outro da mesma forma que gostaria que cuidassem de si», ou seja, com paciência, carinho e compaixão.
3 - Comunicar é uma arte
Para um auxiliar, o ato de comunicar é duplamente importante, porque implica a comunicação com os idosos, mas também a capacidade de transmitir informações úteis e pertinentes sobre os idosos aos seus colegas, superiores e outros profissionais que fazem parte do processo terapêutico.
No contexto institucional, uma boa comunicação promove a coesão das equipas e a eficácia e eficiência a nível individual e grupal.
Num lar, o trabalho das auxiliares geriátricas faz-se em equipa e os horários são rotativos, razão pela qual o bom funcionamento do lar está dependente da capacidade em transmitir informação útil para satisfazer as necessidades dos idosos. Saber comunicar com os colegas de forma clara e objetiva beneficia toda a instituição, pois todos desempenham tarefas comuns e têm os mesmos objetivos.
Comunicar é um ato de partilha entre quem cuida e quem está a ser cuidado, e obriga a que o cuidador seja um bom ouvinte.
A comunicação pode ser verbal e não verbal, da mesma forma que o idoso poderá não conseguir comunicar de todo, seja por gestos, palavras ou escrita. Dessa forma, a auxiliar geriátrica deve ser um boa observadora e interpretar todos os sinais que o idoso lhe transmite (através do olhar, da leitura de expressões faciais ou até através da ausência de comunicação).
Prestar atenção implica uma atitude de compreensão e a vontade de ajudar o idoso a satisfazer as suas necessidades.
A comunicação é fundamental na interação entre cuidadores e idosos, pois é através dela que se estabelecem relações de entreajuda e confiança. Cumpre também outra função essencial: a quebra da solidão e a resposta a necessidades emocionais, sociais e até intelectuais do idoso.
4 - O saber não ocupa lugar
Atualmente, os cursos já estão estruturados de forma a abranger a vasta gama de conhecimentos de que uma auxiliar de geriatria necessita para executar as suas tarefas, entre os quais: noções básicas de anatomia e fisiologia, primeiros socorros, saúde mental, cuidados na saúde e prevenção e controlo de infeções.
No dia-a-dia, a auxiliar acaba por adquirir noções básicas de áreas que não domina, como fisioterapia, psicologia ou enfermagem.
Em momento algum a auxiliar de geriatria substitui o papel fundamental dos especialistas no processo terapêutico, mas o contato direto com estes saberes técnicos acaba por influenciar de forma positiva o modo como cuida dos idosos.
A aprendizagem faz-se por observação e qualquer intervenção em áreas mais técnicas deve ser orientada pelo especialista.
É muito importante ter alguns conhecimentos de fisioterapia para que não sejam feitos movimentos que causem contraturas ou piorem lesões preexistentes, prejudicando a funcionalidade dos idosos. Esta questão é especialmente importante no tratamento de idosos acamados, que precisam de ser movimentados e posicionados no leito diversas vezes por dia e que lhes sejam feitos exercícios de alongamento e movimentações que previnam úlceras de pressão.
É inevitável que os cuidadores em lares aprendam com os enfermeiros, que os orientam para que os cuidados prestados promovam a saúde e/ou ajudem no processo de cura.
Embora estes profissionais desempenhem funções muito distintas, têm um objetivo comum: garantir o conforto e bem-estar do idoso durante o tratamento de doenças. Podem existir situações em que a auxiliar tem que desempenhar algumas das tarefas dos enfermeiros, como fazer curativos, aplicar injeções ou organizar a medicação.
A psicologia fornece ferramentas importantes à auxiliar geriátrica para lidar com as alterações emocionais, físicas, sociais e cognitivas do idoso durante o envelhecimento.
A qualidade de vida dos idosos institucionalizados está também diretamente relacionada com a forma positiva ou negativa como reagem aos desafios do envelhecimento. São vários os fatores que podem desencadear crises, conflitos ou depressões, de que são exemplo as mudanças físicas e orgânicas, a condição de dependência e as perdas cognitivas.
Em conjunto com o psicólogo, a auxiliar pode ajudar o idoso a adaptar-se às novas circunstâncias que vão surgindo.
Trabalhar com idosos significa também ajudá-los a lidar com a dor moderada ou intensa, cuja prevalência é maior em idosos com níveis de dependência elevados. Muitas vezes crónica, a dor pode ser diminuída pela toma de anagésicos ou antidepressivos. A auxiliar deve ser especialmente compreensiva quando lida com a dor, pois a dor transforma o temperamento dos idosos e é muito importante que os que se encontram nestas circunstâncias sejam tratados com carinho e compaixão.
5 - Cuide de sí, para cuidar bem do outro
Todos os seres humanos precisam de cuidados e, na atividade assistencial, idosos e auxiliares necessitam de se sentir acarinhados, ver os seus medos apaziguados e sentir que as suas necessidades e desejos são levados em consideração.
Cuidar de idosos é um trabalho ininterrupto e delicado, que rapidamente leva a situações de desgaste físico e emocional.
A constante exposição ao stress pode levar ao burnout, uma condição caracterizada pela irritabilidade, fadiga, problemas de sono, sentimentos de impotência ou desespero e isolamento social. É na prática do quotidiano que a auxiliar de geriatria tem de aprender a lidar com as pressões da vida num lar.
É essencial que a auxiliar desenvolva estratégias que promovam o autocuidado, a gestão do stress e a sobrecarga emocional.
Caso contrário, o profissional está sujeito a um esgotamento que pode levar à despersonalização, ou seja, a uma apatia emocional que faz com que os cuidados sejam prestados de forma desumanizada e desligada. Outra consequência é a redução da produtividade, devido à desmotivação e à perda de interesse pelas tarefas desempenhadas.
A auxiliar geriátrica deve reter os aspetos positivos do seu trabalho, valorizar o que correu bem e partilhar o que correu mal com colegas e superiores.
Para que os cuidados prestados sejam de excelência, é necessário que a auxiliar de geriatria cuide de própria e isso significa, entre outras coisas, socializar, praticar exercício físico e tentar relaxar nos momentos mais tensos, mesmo que seja apenas respirar fundo algumas vezes.