[Covid-19] Desumana ou prudente? A imposição de quarentena à entrada nos lares

Por Joana Marques , 18 de Maio de 2020 Lares e Residências

Desde o início desta pandemia que não houve qualquer dúvida de que a população idosa seria a mais afetada pelo novo coronavírus. Por essa razão, a 16 de Março, entraram em vigor  medidas para minimizar os riscos de contágio em lares, de que é exemplo a proibição de visitas a idosos já institucionalizados.


As novas admissões em lares não foram proibidas e, ao contrário de países da Europa, os lares portugueses nunca suspenderam a admissão de novos utentes por ordem da própria DGS.



 Considerada desumana por alguns, mas muito necessária por outros, poderá a quarentena à entrada evitar que os lares em Portugal se transformem em «bombas-relógio»? Propomos neste artigo uma reflexão sobre esta matéria a partir do que foi feito em lares de países europeus onde se vivem situações verdadeiramente trágicas.

A importância das novas admissões

À margem do que vai sendo noticiado relativamente aos casos positivos em instituições para idosos, por vezes até de forma sensacionalista, na realidade é nos lares que os idosos estão mais seguros. A DGS manteve as novas admissões sob rigorosas medidas de segurança para a proteção e segurança de todos: idosos, funcionários, equipas técnicas e familiares.


Os hospitais são um dos maiores focos da Covid-19, pelo que, enquanto durar a pandemia, os lares vão continuar a ser fundamentais na transição da alta hospitalar dos idosos. ​



A transição dos idosos dos hospitais para os lares permite libertar camas e que a família não se sinta tão pressionada por não ter condições ou meios para os receber. Além disso, garante a prestação de cuidados de saúde a esta população de risco, numa altura em que o apoio domiciliário é preterido devido aos riscos acrescidos que lhe estão associados.

Objetivo: Lares livres da Covid-19

A DGS decretou que todas as novas admissões estão sujeitas a uma avaliação clínica, que confirme que não existem sinais de infeção respiratória, à realização de um teste laboratorial que dê negativo à Covid-19 e ao cumprimento de um período de isolamento de, pelo menos, 14 dias, renovável sempre que o idoso saia da instituição por um período superior a 24 horas.



14 dias de reclusão à entrada para proteção de todos os residentes.
O idoso deve ser sensibilizado para o caráter transitório e excecional desta medida, imposta pela DGS para seu próprio benefício.



O isolamento durante 14 dias é considerado por alguns uma medida desumana, e até uma forma de violência psicológica exercida sobre o idoso. Para a DGS, é uma medida fundamental e obrigatória. O utente e os seus familiares devem estar devidamente informados sobre a imposição da quarentena, para que todos estejam conscientes da importância desta medida na manutenção dos lares como um espaço livre da Covid-19. 


O idoso deve ser sensibilizado para o caráter transitório e excecional desta medida: os 14 dias de reclusão imposta são para seu próprio benefício, após os quais o idoso poderá interagir normalmente com os restantes residentes.



Por mais polémica que seja, a quarentena obrigatória nos lares é preferível às consequências observadas nos países europeus, onde os procedimentos não foram semelhantes.



O confinamento antes de uma nova admissão é polémico porque na maior parte dos casos o idoso não compreende porque é que tem que ficar fechado durante duas semanas num quarto, sob fortes medidas de proteção individual, depois de ter testado negativo à doença, num ambiente estranho e ao qual ainda não teve tempo de se adaptar.  

O confinamento e as quarentenas obrigatórias têm sido um grande desafio para um ser humano adulto, ativo e autónomo. Por isso, de certa forma, pode ser considerado «cruel» impor solidão aos que mais a sentem numa idade mais avançada. Ainda assim, consideramos ser preferível manter o caráter obrigatório das novas entradas em lares sob medidas tão restritivas, vendo as consequências noutros países europeus, onde os procedimentos foram diferentes.

Caso dramático de Espanha

O surto de coronavírus tem tido um impacto particularmente negativo sobre os idosos institucionalizados no país vizinho. Nos últimos dois meses (Março e Abril), Espanha não tem tido recursos humanos suficientes para lidar com a violência com que a doença se fez sentir nestes lares, chegando mesmo a haver situações em que vivos e mortos convivem no mesmo quarto, em total abandono.

​As autonomias têm optado por suspender por completo as novas admissões, exceto em situações de emergência social, o que parece pouco provável tendo em conta que se estima que em Espanha uma em cada quatro mortes Covid-19 corresponda a idosos institucionalizados.

Podem ser feitas novas admissões sem restrições se o idoso se apresentar assintomático e o isolamento só está previsto caso existam indícios de nexo epidemiológico.



Na teoria e oficialmente, o Governo espanhol não proibiu novas admissões, mas perante este tipo de cenários é compreensível que muitos lares tenham suspendido as novas entradas por iniciativa própria, como tem vindo a ser noticiado.


A Itália pagou muito caro

Na região da Lombardia, a mais fustigada pela Covid-19, os idosos nunca tiveram grandes hipóteses de sobrevivência. A 8 de Março, foi tomada uma decisão que se veio a revelar mais tarde catastrófica e até criminosa, uma vez que o que se passou desde então nos lares desta região está sob investigação policial.

O presidente da região da Lombardia ofereceu 150€ aos lares de idosos que recebessem doentes com Covid-19, para aliviar a pressão que já então estava a ser exercida sobre os hospitais.



Acolher idosos infectados em lares foi como acender um rastilho de pólvora, transformando as instituições em verdadeiros viveiros da Covid-19. 

Este tipo de atuação não corresponde minimamente às recomendações do equivalente em Itália à DGS, que desde cedo proibiu o acesso aos lares de idosos sintomáticos e só estavam autorizadas novas admissões, tanto de idosos como de profissionais de saúde, em casos extraordinários e imprevistos. Todas as novas entradas ficaram sujeitas a um período de quarentena em áreas de isolamento específicas. Mais um caso em que a teoria não se aplicou à prática.

No resto da Europa as medidas variaram

Os organismos de França, Inglaterra e Alemanha emitiram diretivas semelhantes às que foram decretadas em Portugal: testes prévios à Covid-19, isolamento profilático de 14 dias em quarto ou área específica. No entanto, em nenhum existe capacidade real de testar todos os futuros residentes, devido à sobrecarga preexistente nos laboratórios hospitalares.

No início de Abril, 60% dos lares franceses já tinha suspendido as novas admissões. Na Alemanha, as novas admissões eram consideradas uma séria ameaça e desaconselhadas. Em Inglaterra o surto estava descontrolado devido à tentativa de criação de imunidade de grupo.

Idosos ingleses foram aconselhados pelos próprios lares a assinar ordens de não reanimação, como se as suas vidas não valessem a pena ser salvas.



Tal como em Portugal, todos os países europeus foram obrigados a elaborar planos de contingência para lares e foram definidas várias medidas de prevenção para impedir que os lares fossem transformados em epicentros Covid-19.


Em Portugal, percentagem de óbitos em lares está abaixo da média europeia


Na conferência de imprensa de dia 9 de Maio, a DGS anunciou que até aquela data tinham ocorrido nos lares cerca de 450 mortes de idosos devido à Covid-19. O número é elevado, tanto mais que à data o número correspondia a cerca de 40% das mortes contabilizadas no país. 

Uma morte por Covid-19 é sempre uma morte a mais. Serve-nos de consolo o facto de a nossa situação estar mais controlada.



As nova admissões diminuíram nestes últimos meses, seja por falta de vagas ou de confiança por parte das famílias, algumas das quais se converteram em cuidadores informais temporários dos seus familiares idosos. Mas elas não foram suspensas por nenhuma instituição, a não ser em casos de emergência, que se traduzem no encerramento temporário para desinfeção de instalações decorrente da detecção de um elevado número de casos do novo coronavírus.


A quarentena imposta é desconfortável, mas é também a medida mais prudente para a manutenção de segurança dos lares.



Ainda que cause algum desconforto pensarmos que o nosso familiar idoso pode ser obrigado a estar isolado e completamente sozinho durante duas semanas se quiser ser admitido num lar, esta é uma medida necessária. A imposição da quarentena é um mal necessário e esta medida até poderá ser aliviada à medida que os testes se forem tornando mais fidedignos. Até lá, parece ser um mal menor quando comparado com as violações de direitos humanos e de total abandono dos idosos nos lares que têm ocorrido em vários outros países europeus.


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